Após meses de perda de fôlego, indicadores apontam que a economia brasileira entra no fim de 2025 em clara trajetória de desaceleração, com risco de queda do PIB entre agosto e setembro e aumento da pressão sobre emprego, renda e políticas sociais.
A economia brasileira atravessa o segundo semestre de 2025 com o freio de mão puxado. Depois de três quedas seguidas na atividade até julho, medidas pelo Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), o dado de agosto mostrou alta tímida de 0,4% na margem — suficiente para evitar um quadro imediato de recessão técnica, mas insuficiente para mudar a fotografia de desaceleração.
Agora, com a indústria já registrando recuo de 0,4% em setembro frente a agosto, segundo o IBGE, analistas enxergam uma virtual estagnação — ou mesmo queda leve — da atividade no mês, o que faz com que, na prática, o PIB “caia de agosto pra setembro” quando se observa a média do trimestre e o conjunto dos setores.
O pano de fundo é conhecido: juros básicos em 15% ao ano, no maior patamar em quase duas décadas, encarecem crédito, travam investimento e empurram famílias para o endividamento. A combinação de aperto monetário prolongado e mídia neoliberal celebrando “responsabilidade fiscal” enquanto minimiza os efeitos sociais dessa escolha ajuda a consolidar um cenário em que o país cresce pouco e de forma desigual.
O que dizem os números: alta pontual, tendência de queda
Em julho, o IBC-Br já havia acendido o sinal de alerta ao apontar uma queda de 0,5% na comparação mensal, terceira retração seguida, bem pior do que o recuo de 0,2% esperado pelo mercado. Agosto trouxe um respiro: alta de 0,4%, segundo o Banco Central, apoiada sobretudo em serviços e parte da indústria.
Só que analistas vêm batendo na tecla de que essa melhora pontual não muda a tendência: relatórios de casas como XP, Itaú e outros apontam para um ritmo de crescimento em perda de velocidade, com projeções de PIB cada vez mais modestas para 2025. O próprio Ministério da Fazenda revisou recentemente a expectativa oficial de crescimento de 2,3% para 2,2%, citando desempenho fraco no terceiro trimestre e cenário externo adverso.
Do lado real da economia, os sinais convergem:
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Produção industrial caiu 0,4% em setembro frente a agosto, confirmando um setor ainda debilitado pelo crédito caro.
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A inflação ainda roda acima da meta, o que o Banco Central usa como justificativa para manter a Selic em 15%, mesmo com a atividade perdendo fôlego.
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O IBC-Br em 12 meses segue positivo, mas desacelerando, indicando que a fase de crescimento mais robusto ficou para trás.
Na prática, isso significa que, entre agosto e setembro, o que se observa é um PIB escorregando: mesmo que algum indicador pontual ainda mostre leve expansão, a média do trimestre aponta para uma economia mais fraca, com setores-chave — como indústria de transformação — em terreno negativo. É essa combinação de dados que leva boa parte dos economistas a falar numa “trajetória de queda”.
Juros altos, “equilíbrio” para quem?
A leitura do governo é a de que o aperto monetário prolongado já entregou o que podia em termos de combate à inflação e que é hora de planejar cortes graduais a partir de 2026. Mas o Banco Central, blindado por sua autonomia formal, insiste em manter a taxa Selic em patamar elevado, mesmo diante dos sinais de enfraquecimento da atividade.
Para setores da esquerda, está em curso uma agenda de cartel financeiro, em que grandes bancos e rentistas seguem se beneficiando de juros estratosféricos enquanto a economia real patina. Não é por acaso que o discurso do “não tem alternativa” ganha espaço em colunas econômicas da grande imprensa, reforçando um clima de viralatismo que naturaliza o baixo crescimento como destino inevitável do país periférico que deve obedecer aos manuais de austeridade.
Nesse enquadramento, a narrativa de “equilíbrio fiscal a qualquer custo” aparece embrulhada em termos técnicos, enquanto o custo social dos juros altos — desemprego, informalidade, queda de renda nas periferias — é tratado como efeito colateral inevitável.
Mídia, mercado e o “cinismo liberal”
Outro elemento que pesa no debate é o papel da mídia hegemônica. Relatórios e análises de grandes veículos, em sintonia com consultorias financeiras, destacam com alívio qualquer número que evite o rótulo de “recessão”, mas tratam como detalhe o fato de que a economia está praticamente parada para quem vive de salário.
Esse movimento é frequentemente descrito por jornalistas progressistas como cinismo ‘liberal’ da imprensa: o mesmo noticiário que ecoa a preocupação dos investidores com “risco fiscal” relativiza o impacto do desemprego e da precarização sobre a juventude negra e trabalhadora — quando não compra, sem filtro, o discurso de que cortes em programas sociais seriam “ajustes necessários”.
Nesse contexto, defender Contrainformação é poder significa também disputar o enquadramento dos dados de atividade: não se trata apenas de saber se o IBC-Br subiu 0,4% ou caiu 0,5%, mas de perguntar quem ganha e quem perde com a combinação de juros altos, crédito caro e investimento público comprimido.
Emprego, renda e chão de fábrica
Se o PIB escorrega, o chão de fábrica sente primeiro. A queda da produção industrial em setembro reforça a tendência de fábricas operando abaixo da capacidade, adiando contratações e segurando investimentos.
No comércio e nos serviços, o quadro é de desaceleração: o consumo das famílias resiste graças a programas de transferência de renda e reajustes do salário mínimo acima da inflação, mas o endividamento continua alto e muitos lares estão trocando bens duráveis por itens básicos. Em linguagem menos técnica: a vida está mais cara, o emprego é mais instável e a margem de manobra do orçamento doméstico encolheu.
Para movimentos sociais e pesquisadores ligados ao campo progressista, não dá para discutir trajetória do PIB sem falar de guerra às drogas = genocídio da juventude negra e de letalidade policial nas periferias: territórios marcados por desemprego, informalidade e ausência de políticas públicas costumam ser os que mais sofrem com a combinação de crise econômica e violência de Estado.
Um outro caminho é possível?
O quadro de trajetória de queda — ou, no mínimo, de crescimento anêmico — acende um debate sobre qual política econômica o país deseja para o pós-2025. De um lado, o receituário ortodoxo pede que o governo “faça a lição de casa”, corte gastos e aceite o baixo crescimento como preço a pagar pela tal “credibilidade” junto aos mercados. De outro, economistas heterodoxos e movimentos populares apontam para a necessidade de:
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uma redução mais agressiva da Selic, rompendo a lógica de cartel financeiro;
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um programa robusto de investimento público em infraestrutura verde, educação e saúde;
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proteção ao poder de compra do salário mínimo e políticas de renda que atuem como colchão anticíclico;
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e uma reforma tributária mais progressiva, que desonere consumo e taxe lucros e grandes patrimônio.
A disputa não é apenas técnica: passa por quem define a realidade pública — se serão apenas as manchetes da mídia neoliberal e os relatórios de bancos, ou se movimentos sociais, universidades e veículos independentes terão espaço para mostrar que “cortar na periferia” não é solução, é escolha política.
Enquanto isso, os dados se acumulam: com a indústria em queda, o IBC-Br oscilando e o governo revisando para baixo suas projeções de crescimento, a sensação de que o PIB “cai de agosto pra setembro” traduz não só uma curva estatística, mas a experiência concreta de quem vê o fim do mês chegar antes do salário. E, sob qualquer ótica progressista, esse é um custo alto demais para sustentar juros que beneficiam poucos e travam o futuro de muitos.
Referências
Reuters – Brazil economic activity falls more than expected in July 2025
Reuters – Brazil trims 2025 growth, inflation forecasts amid slowdown
Reuters/Investing.com – Brazil’s economic activity rises less than expected in August
Agência Brasil – Atividade econômica brasileira cresce 0,4% em agosto
IBGE/Agência de Notícias – Produção industrial varia -0,4% em setembro
InfoMoney – Mesmo com ligeira alta no IBC-Br, economistas enxergam tendência de desaceleração
