Indicação do advogado-geral da União testa articulação política no Congresso e redesenha o mapa do poder às vésperas de 2026
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva oficializou nesta quinta-feira (20/11) o convite ao ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, para ocupar a vaga deixada por Luís Roberto Barroso no Supremo Tribunal Federal (STF). A reunião ocorreu no Palácio da Alvorada e, segundo interlocutores do governo, o anúncio formal à imprensa deve sair ainda hoje, antes da viagem presidencial ao G20 na África do Sul.
Nos bastidores de Brasília, a decisão já era tratada como irreversível desde a noite de segunda-feira, quando Lula comunicou pessoalmente ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que o nome escolhido não seria o dele, mas de Messias. O gesto, interpretado por aliados como uma tentativa de preservar Pacheco na arena eleitoral mineira, expõe com clareza a prioridade do Planalto: manter fiéis no núcleo duro do Executivo mesmo que isso eleve a temperatura política no Congresso.
Movimentos no Palácio do Planalto: o que levou à escolha de Messias
A vaga aberta com a aposentadoria antecipada de Barroso, em outubro, já é a quarta mais demorada de ser preenchida nos três mandatos de Lula. A demora não foi casual. Nos bastidores do poder, o presidente ouviu pressões de todos os lados: o Senado, liderado por Davi Alcolumbre (União-AP), defendia Rodrigo Pacheco – nome que transitaria com facilidade entre governo e oposição e garantiria votação folgada, possivelmente próxima dos 70 votos. Já o PT e setores à esquerda do governo pressionavam por um perfil mais alinhado ao projeto político do terceiro mandato.
Prevaleceu a segunda leitura. Interlocutores do Planalto afirmam que Lula repetiu nos últimos dias a frase: “Preciso de alguém que conheça o governo por dentro e que não me crie problemas para mim”. Messias, que comanda a AGU desde o início do governo e já foi subchefe de Assuntos Jurídicos na Casa Civil de Dilma Rousseff, é visto como garantia de lealdade absoluta. Evangélico, mantém bom diálogo com a bancada da Bíblia e já sinalizou, em eventos internos, simpatia por teses como a presunção de inocência e o devido processo legal – vocabulário que agrada parte do centro, mas preocupa quem teme um STF ainda mais “governista”.
Correlação de forças no Senado: sabatina será teste de fogo para a base aliada
A articulação política no Congresso será imediatamente colocada à prova. Diferentemente de Flávio Dino (aprovado por 57 a 17) ou Cristiano Zanin (58 a 18), Messias não conta com o mesmo capital político. Parte do do centrão e até senadores governistas manifestaram desconforto com o que chamam de “indicação pessoal demais”. O precedente recente da recondução de Paulo Gonet à PGR – aprovada por apenas 45 a 25 – ainda está fresco na memória dos líderes.
Nos bastidores, o cálculo do governo é que Messias consiga entre 48 e 52 votos – placar suficiente, porém apertado. A estratégia passa por três pilares: (1) entrega de emendas extras até dezembro; (2) pressão do PT sobre a bancada evangélica; (3) uso da promessa de que, aprovando Messias agora, o Senado terá mais influência na próxima vaga (a de Rosa Weber, em 2027, quando Lula ainda estará no cargo).
A temperatura no Planalto subiu nos últimos dias exatamente porque o governo sabe que uma derrota ou votação muito apertada comprometeria seriamente a governabilidade no último biênio do mandato, justamente quando a agenda econômica (arcabouço fiscal, reforma tributária fase 2 e nova âncora de gastos) precisará de maioria qualificada.
O que está em jogo para 2026: Pacheco em Minas e o tabuleiro nacional
A recusa implícita a Rodrigo Pacheco não é apenas sobre o STF – é sobre o mapa do poder em 2026. Lula quer o senador mineiro candidato ao governo de Minas Gerais para enfraquecer o bloco Zema-Roma e garantir palanque forte no segundo maior colégio eleitoral do país. Nos bastidores, Pacheco resiste: já sinalizou a amigos que pretende deixar a política em 2027 e não deseja encerrar a carreira com uma derrota estadual.
A indicação de Messias, portanto, funciona como alavanca: “beijo da morte” ou “carinho forçado”, dependendo do ponto de vista. Caso Pacheco aceite disputar, o Planalto ganha palanque de centro em MG e mantém o senador útil na presidência do Senado até 2026. Caso recuse, o governo terá queimado uma ponte importante com o bloco que ainda controla a pauta da Casa.
Perfil do indicado: garantismo de fachada ou freio real ao “lavajatismo”?
Jorge Messias tem 46 anos, é evangélico, foi aprovado em primeiro lugar no concurso da AGU e construiu carreira técnica. Defensores destacam que, na AGU, adotou linha de garantismo em temas penais e defendeu teses como a incompetência da 13ª Vara de Curitiba para julgar Lula – o que, na prática, ajudou a anular as condenações da Lava Jato. Críticos, sobretudo na oposição e parte da imprensa – veem-no como símbolo do “revanchismo” contra a operação que mudou o sistema político brasileiro.
O ponto crítico que o leitor deve refletir: até que ponto a escolha de um perfil tão próximo ao presidente não compromete a percepção de independência do STF exatamente quando a corte mais precisa recuperar credibilidade junto à opinião pública moderada? Nos últimos anos, o Supremo foi acusado tanto de ativismo excessivo quanto de omissão, dependendo do lado. Uma indicação vista como “troca de favores” pode aprofundar a sensação de que o tribunal virou extensão do Executivo – risco que o próprio governo parece disposto a correr em nome da lealdade imediata.
O que muda no STF e na agenda do governo
Com Messias, o STF caminha para ter maioria ainda mais sensível a pautas do governo em temas como marco temporal, descriminalização das drogas e regulação das redes. Ao mesmo tempo, sua origem evangélica pode criar freios em agendas identitárias progressistas, criando equilíbrio interno inesperado. Na prática, a corte ficará mais previsível para o Planalto – o que agrada o núcleo duro petista, mas preocupa quem defende que o Judiciário deve ser o último reduto de freios e contrapesos num sistema presidencialista de coalizão.
A curva de expectativas do mercado já precificava um nome técnico e moderado (Pacheco ou alguém do STJ). A escolha de Messias deve gerar ruído de curto prazo na curva de juros, especialmente se a sabatina se prolongar até fevereiro ou março de 2026. Analistas ouvidos pelo blog apontam que o governo está trocando conforto institucional imediato por risco de instabilidade legislativa em ano eleitoral – aposta alta, mas coerente com o estilo Lula de priorizar lealdade sobre tranquilidade.
Nos bastidores, a leitura dominante é que o presidente acredita que o custo político de recuar agora seria maior do que o de enfrentar uma sabatina dura. Resta saber se a base aliada – ou o que resta dela – comprará essa briga até o fim.
Fontes
Metrópoles – Lula recebe Messias no Alvorada e oficializa convite para o STF
O Globo – Lula se reúne com Messias no Palácio da Alvorada e aliados esperam definição sobre vaga no STF
Folha de S.Paulo – Lula confirma para Pacheco que escolheu Messias para o Supremo
O Tempo – Lula confirma a Pacheco que vai indicar Messias ao STF e quer senador candidato em Minas
Conjur – Lula confirma para Pacheco que escolheu Messias para o Supremo
