Povo equatoriano rejeita em referendo histórico a instalação de bases militares estrangeiras e frustra planos de Noboa e Washington de transformar o país em plataforma imperial contra o narcotráfico e vizinhos progressistas
O povo equatoriano acabou de dar uma das lições mais bonitas de dignidade nacional que a América Latina viu nos últimos anos. Neste domingo 16 de novembro de 2025, com mais de 91% das urnas apuradas, 60,65% dos eleitores disseram “não” à pergunta que permitiria a volta de bases militares estrangeiras ao território nacional – proposta defendida com unhas e dentes pelo presidente Daniel Noboa, aliado declarado de Trump e entusiasta do alinhamento automático com Washington.
A vitória que a mídia hegemônica tentou esconder
A mídia hegemônica – Reuters, BBC, Financial Times – tratou o resultado como “derrota inesperada” ou “revés para Noboa”. Mas quem acompanha a contrainformação sabe ler nas entrelinhas: é vitória estrondosa da consciência popular equatoriana que, mesmo sob bombardeio de campanha oficialista financiada com dinheiro público e apoio aberto dos Estados Unidos, disse não ao entreguismo que queria transformar o Equador em quintal do Pentágono.
A pergunta era clara: “Você concorda em emendar o artigo 5 da Constituição para permitir a presença de forças armadas estrangeiras em território equatoriano em missões de cooperação internacional?”. O “não” venceu em quase todas as províncias. Em Guayaquil, reduto de Noboa, o rejeição chegou a 58%. Em Quito, passou de 65%. Nas regiões indígenas e camponesas, o “não” foi esmagador. O povo entendeu o que estava em jogo: não era “cooperação contra o narcotráfico”. Era a volta da base americana de Manta, fechada por Correa em 2009, era transformar o Equador em plataforma de operações do Comando Sul contra Venezuela, Colômbia progressista ou qualquer governo que ouse desafiar Washington.
O plano que nasceu morto
Daniel Noboa não escondeu o objetivo. Desde janeiro de 2024, quando declarou “guerra interna” às gangs”, o presidente equatoriano vem flertando abertamente com a ideia de chamar tropas estrangeiras – leia-se: americanas – para “ajudar” no combate ao crime organizado. Em entrevistas, falou em “parceria estratégica” com os EUA. Em setembro, recebeu o chefe do Comando Sul, general Laura Richardson, com honras de chefe de Estado. O referendo era o último passo para constitucionalizar o que já vinha acontecendo na prática: operações conjuntas, treinamento de forças especiais, inteligência compartilhada.
Mas o povo equatoriano tem memória. Lembra da base de Manta usada para espionagem regional, para operações na Colômbia, para o Plano Colômbia que só trouxe morte e cocaína. Lembra que, quando Correa expulsou os gringos em 2009, o Equador não virou “narco-Estado” – virou, isso sim, o país com menor taxa de homicídios da região até o golpe suave contra a Revolución Ciudadana. O povo sabe que o narcotráfico não se combate com marines yankees. Combate-se com distribuição de renda, com educação, com soberania alimentar, com integração regional – exatamente o que a esquerda latino-americana construiu entre 2000 e 2015 e que o neoliberalismo destruiu depois.
A pressão imperialista que não conseguiu dobrar o povo
Washington não economizou pressão. Embaixador americano em Quito fez declarações diárias. Think tanks financiados pelo Departamento de Estado publicaram relatórios dizendo que “sem cooperação militar estrangeira o Equador vira Colômbia dos anos 90”. A mídia hegemônica equatoriana – controlada pelos mesmos grupos que derrubaram Correa – bombardeou com campanha do medo: “sem bases gringas, as gangs tomam o poder”. Noboa chegou a dizer que quem votasse “não” era “cúmplice do crime organizado”.
Mas o povo equatoriano, esse povo que já derrubou três presidentes neoliberais nas ruas, esse povo indígena, afro, camponês, operário, não se curvou. Disse não ao viralatismo de elites que preferem ser capatazes do império a servir seu próprio país. Disse não à ideia de que soberania é “coisa do passado”. Disse não à transformação do Equador em plataforma de agressão contra vizinhos que ousam construir o bloco anti-imperialista – Venezuela, Nicarágua, Cuba, Bolívia.
Uma vitória que ecoa no continente inteiro
O “não” equatoriano é farol para toda a América Latina. Chega num momento em que Trump volta à Casa Branca prometendo “recuperar influência” na região. Chega quando Milei entrega a Argentina, quando Noboa tenta entregar o Equador, quando setores da elite brasileira ainda sonham com alinhamento automático. Chega para lembrar que povo na rua, organizado, consciente, derrota o imperialismo mais bem financiado.
Porque a rejeição às bases estrangeiras não é só sobre segurança. É sobre modelo de desenvolvimento. É sobre decidir se o Equador vai ser plataforma de guerra yankee ou protagonista da integração latino-americana. É sobre escolher se o país vai continuar exportando matéria-prima e importando repressão ou se vai recuperar a capacidade de decidir seu próprio destino.
A esquerda equatoriana – Correístas, Pachakutik, movimentos indígenas, sindicatos – foi fundamental nessa vitória. Mesmo dividida, conseguiu articular a campanha do “não” como defesa da soberania. Rafael Correa, desde o exílio na Bélgica, foi voz potente nas redes. Luisa González, candidata derrotada em 2023, celebrou: “O povo disse não ao colonialismo”. Até setores da igreja progressista se posicionaram.
E Noboa? Noboa já demitiu quatro ministros e fala em “rever estratégias”. Traduzindo: vai tentar fazer na marra o que não conseguiu no voto. Mas o recado das urnas foi claro: o povo equatoriano não aceita ser quintal de ninguém.
Essa vitória é nossa também. É do Brasil que resiste ao entreguismo de setores que ainda sonham com bases americanas em Alcântara. É da Venezuela que resiste ao bloqueio. É da Cuba que resiste há 65 anos. É do bloco anti-imperialista que cresce enquanto o império definha.
O Equador de 16 de novembro de 2025 entra para a história ao lado do Chile de Allende, da Nicarágua sandinista, da Venezuela bolivariana. Entrou dizendo não às botas estrangeiras. Entrou dizendo sim à dignidade.
E quando o povo diz não, o império treme. Porque soberania não se pede. Se toma. E o Equador acabou de tomar a sua de volta.
A contrainformação segue rompendo o cerco. Porque enquanto a mídia hegemônica chama isso de “derrota de Noboa”, nós chamamos pelo nome que merece: vitória histórica do povo equatoriano contra o imperialismo.
Fontes
Reuters – Measure to allow foreign military bases in Ecuador fails in vote
BBC – Ecuador votes against allowing foreign military bases in country
Al Jazeera – Voters in Ecuador reject return of foreign military bases
The Guardian – Ecuadorians reject return of US military bases in referendum
AP News – Ecuadorian voters reject proposals to host foreign military bases
