Entre bastidores de Brasília, governabilidade e ancoragem fiscal, o tabuleiro que leva a 2026 combina o que os números mostram (sem achismo) com sinais da The Economist sobre tendências para o próximo ciclo
A corrida de 2026 já começou — e, se há algo que diferencia este ciclo, é a confluência entre o mapa político estadual, a fadiga da polarização e uma agenda econômica pressionada por dívida, inflação passada recente e incerteza global. Nas últimas semanas, análises internacionais (como a edição anual The World Ahead, da The Economist) voltaram a destacar que as eleições no Brasil seguem como métrica de resiliência democrática e de previsibilidade de regras, do orçamento às políticas climáticas. Embora se trate de um guia global (e não de um dossiê exclusivo sobre o Brasil), o relatório costuma projetar o que está em jogo quando urnas e mercado se cruzam — e 2026 entra nesse radar.
Antes de avançar, um esclarecimento factual importante: ao contrário do que por vezes aparece no debate público, não há eleições municipais em 2026. Em 2026, o Brasil realizará eleições gerais: presidente e vice, governadores e vices, Senado (renovação de 1/3), Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas. As últimas eleições municipais ocorreram em 2024; os pleitos de prefeitos e vereadores voltam em 2028. A distinção é essencial para entender a leitura de forças locais e seus efeitos na sucessão presidencial.
O fio da meada: dos “prefeitos-sinal” de 2024 às correlações de 2026
A chave analítica para 2026 reside no que 2024 já acenou. Em capitais e centros urbanos, o desempenho de legendas de centro e centro-direita foi lido, por parte da imprensa internacional, como um freio parcial à esquerda — com São Paulo simbolizando o teto de expansão lulista nas maiores praças. Esse recado, ressalvadas as margens de erro e particularidades locais, alimentou a hipótese de que a disputa presidencial dependerá menos da retórica nacional e mais de palanques regionais competitivos e alianças que maximizem tempo de TV, capilaridade e voto moderado.
Em linguagem de mapa do poder, 2024 produziu três pistas para 2026: (1) o centro político segue relevante em grandes cidades; (2) a direita conserva musculatura territorial, ainda que fragmentada; (3) o lulismo enfrenta um eleitor urbano sensível a custos de vida, segurança e prestação de serviços. Para 2026, isso se traduz em correlação de forças no âmbito estadual: governadores com boa aprovação tendem a “puxar” bancadas; candidaturas ao Planalto tentarão colar imagens a gestores com credibilidade e entregas. É a política de quem manda em quê.
Bastidores, clima e articulação: o centro se move
Nos bastidores do poder, a temperatura política apontou, no primeiro semestre de 2025, desgaste do governo federal — com quedas relevantes de aprovação em alguns levantamentos nacionais. Embora pesquisas oscilem ao longo do ano (e devam ser lidas por séries históricas), o conjunto dos dados reforçou um quadro de humor volátil: da mínima de aprovação aferida por institutos tradicionais no começo de 2025 à recuperação em alguns cenários posteriores, a mensagem de fundo é que o eleitor está reativo a preços, emprego, renda e sensação de estabilidade. Dados e comportamento do eleitor seguem no centro do tabuleiro.
Essa ambivalência se nota também no tira-teima das intenções de voto. Compilações de sondagens ao longo de 2025 mostram cenários em que Lula lidera, empata ou aparece tecnicamente em disputa com nomes da direita — com viés de resposta e desenho amostral influenciando resultados. A fotografia, não o filme, sugere vantagem do incumbente em parte das séries, mas sem blindagem contra movimentos de opinião em ano eleitoral. Daí a insistência em ler o que os números mostram (sem achismo), cruzando amostras, metodologias e intervalos de confiança.
No Congresso, a régua para 2026 envolverá governabilidade em torno de reformas e orçamento. O eixo articulação política no Congresso/base aliada disputará cada relatoria sensível, com o centrão pressionando por cargos e espaço orçamentário. A lógica é conhecida: quem ajuda a aprovar pautas em 2025–26 busca retorno local em palanque e emendas; quem trava, mira desgaste do adversário. O quadro federativo, com governadores influentes em colégios eleitorais estratégicos, amplifica esse cálculo. Movimentos no Planalto tendem a ser calibrados por pesquisas setoriais e pela leitura do ambiente de negócios e confiança.
Economia: ancoragem fiscal, curva de juros e previsibilidade
Se a política é o “como”, a economia é o “quanto”. Para analistas de mercado, a dinâmica pós-2026 exigirá ancoragem fiscal mais robusta para estabilizar dívida e reduzir prêmios de risco. Em relatório divulgado hoje, uma casa global reforçou que, qualquer que seja o vencedor, a consolidação terá de avançar — pena de encarecimento de financiamento e perda de tração do crescimento. Em português claro: sinalizações ao mercado e previsibilidade regulatória são condições para que a curva de juros continue precificando cortes sustentáveis, sem sobressaltos cambiais.
No curto prazo, o binômio inflação/renda e a trajetória da Selic seguirão decisivos para o humor do eleitor. O fato de 2026 ser ano de escolha para Planalto e governos estaduais adiciona incerteza “fiscal-eleitoral”: pressões por gastos, reajustes e programas têm potencial de tensionar metas. Aqui, valem os termos operacionais do jargão centrista: regra do jogo para o gasto, metas críveis de resultado primário, e credibilidade no trato de receitas extraordinárias. O fluxo internacional de capitais — pró-ou contra — responde a esses sinais.
Estados, polarização e a disputa pelo centro
O desenho estadual de 2026 importa por três razões: (1) governadores competitivos reduzem dependência de “puxadores” nacionais; (2) a fragmentação partidária redefine coalizões de segundo turno; (3) o combate por voto moderado passa por serviços tangíveis (saúde, educação, segurança). Estudos recentes sobre as eleições de 2024 sugerem que, na ponta, o eleitor não se comportou de forma binária: partidos de centro e centro-direita avançaram localmente sem eliminar a esquerda — e isso tende a forçar, em 2026, uma agenda econômica menos ideológica e mais pragmática, com foco em entregas.
Esse pragmatismo pode “desafiar” a narrativa clássica da polarização total. Diferença entre fato e opinião: há segmentos do eleitorado sensíveis a costumes e identidades, sim; mas a decisão final, em muitos estados, pode pender para quem sinalizar previsibilidade e governança — uma espécie de “centro performático”, que conjuga discurso moderado com resultados mensuráveis. Em termos de dados e comportamento do eleitor, isso se traduz em taxas de abstenção, voto útil e rejeição cruzada que escapam a rótulos ideológicos rígidos.
Pesquisa não é destino — e 2026 soma variáveis novas
É tentador ler os levantamentos de 2025 como prévia definitiva do que virá. Não são. As próprias séries mostram volatilidade: de ondas de desaprovação ao presidente no início do ano a momentos de recuperação posterior; de simulações em que Lula venceria praticamente todos os adversários a cenários de empate técnico com nomes de direita. O recado é metodológico: olhar séries históricas, cruzar fontes e considerar margens de erro. No agregado, o favoritismo do incumbente em parte das sondagens coexiste com uma avenida aberta para competição renhida — governadores bem avaliados e candidaturas de oposição com baixa rejeição podem encostar na reta final.
Do lado institucionais-regras, 2026 repete o desenho do sistema brasileiro: primeiro turno no primeiro domingo de outubro e, se necessário, segundo turno no último domingo do mês; coligações majoritárias e federações partidárias nas proporcionais; divisão de cadeiras no Senado e eleições estaduais espelhando o Planalto. Detalhes que parecem “burocráticos” pesam na conta de governabilidade pós-urna, definindo a engenharia de alianças e a taxa de sucesso legislativo no primeiro ano de mandato.
O que muda — e por que importa
O que muda de 2022 para 2026? Em primeiro lugar, o país chega com um mosaico local atualizado: os prefeitos eleitos em 2024 influenciam redes, máquinas e redes de poder estaduais. Em segundo, a pauta econômica entra mais “técnica” no debate: discussões sobre resultado primário, dívida/PIB e desenho de arcabouço fiscal são hoje parte do vocabulário público — e o mercado cobra sinalizações tempestivas. Em terceiro, a disputa simbólica parece menos potente do que a disputa por previsibilidade nas políticas de segurança, saúde e infraestrutura — onde o eleitor mede entrega e recompensa.
Por que importa? Porque o Brasil precisa de convergências mínimas para crescer: regras estáveis, tributação mais simples, ambiente regulatório claro e proteção social eficaz. Se 2026 produzir incentivos para um centro de governo com governança e credibilidade, a curva de juros tende a precificar menos risco; se, ao contrário, a eleição ampliar ruídos, prêmios sobem e o câmbio sente. Os agentes locais já leram essa mensagem — e Brasília também.
Fontes:
The Economist Group – The Economist launches The World Ahead 2025 (press centre)
The Economist Group – 2024 will put a spotlight on the global state of democracy (press centre)
Reuters – Approval rating of Brazil’s Lula falls to 24% from 35%, pollster Datafolha says
Reuters – Disapproval of Brazil’s Lula hits highest level in his three terms
Reuters – Brazil’s fiscal discipline crucial post-2026 election, warns Goldman Sachs (Nov 12, 2025)
Financial Times – São Paulo loss caps dismal local elections for Brazil’s Lula
AS/COA – What Do Brazil’s Municipal Elections Say About Polarization in the Region?
