Presidente interino barrou compensação ampla por curtailment e alteração no cálculo do Preço de Referência do Petróleo, visando evitar aumentos tarifários e garantir segurança jurídica do setor
O governo federal, por meio da presidência interina de Geraldo Alckmin (PSB), sancionou na última segunda-feira, 24 de novembro de 2025, a Medida Provisória (MP) nº 1.304, que agora se transforma na Lei 15.269/2025, reformulando o marco regulatório do setor elétrico brasileiro. Contudo, a promulgação veio acompanhada de um número significativo de restrições: 22 vetos a dispositivos aprovados pelo Congresso Nacional em 30 de outubro. Entre os pontos mais sensíveis e impactantes, o Planalto rejeitou a compensação ampla por curtailment — os cortes obrigatórios de produção de energia — para usinas eólicas e solares, e manteve a metodologia atual de cálculo do Preço de Referência do Petróleo (PRP). A decisão, antecipada pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD), conforme revelado em entrevista ao programa Roda Viva da TV Cultura, visa prioritariamente conter riscos de aumento tarifário para o consumidor e preservar a segurança jurídica essencial aos investimentos no setor.
Contexto
A Medida Provisória (MP) nº 1.304 foi concebida com o objetivo de modernizar e reformular o arcabouço regulatório do setor elétrico nacional. Sua tramitação no Congresso Nacional foi marcada por intensos debates e pela inclusão de emendas, muitas das quais foram classificadas pelo governo como jabutis – artigos sem relação direta com o texto original da MP. Essas inserções legislativas geraram preocupação no Executivo, que argumentava sobre os potenciais impactos negativos na economia e na estabilidade regulatória.
A aprovação da MP pelo Congresso, em 30 de outubro, trouxe à tona questões complexas, especialmente no que tange a novas regras para o setor elétrico e de óleo e gás. A expectativa do governo, conforme declarado pelo ministro Alexandre Silveira, era de que o presidente interino vetaria os trechos que pudessem comprometer a saúde financeira do setor e, consequentemente, impactar o bolso do consumidor final. A antecipação do ministro indicava a firmeza da postura governamental em coibir alterações que, na sua avaliação, trariam mais riscos do que benefícios.
A sanção presidencial da MP, agora transformada na Lei 15.269/2025, conforme publicado no Diário Oficial da União (DOU) na última terça-feira, 25 de novembro, reflete a prioridade do governo em garantir um ambiente de negócios previsível e justo. A medida provisória original buscava alinhar o setor a novas realidades de mercado e demandas energéticas, e a intervenção via vetos sinaliza um esforço para manter o foco nos objetivos iniciais, evitando distorções que poderiam surgir com os dispositivos incluídos durante a tramitação parlamentar.
Impactos da Decisão
A aplicação dos 22 vetos pelo presidente interino Geraldo Alckmin tem repercussões diretas em dois pilares fundamentais da energia brasileira: a geração elétrica e o setor de petróleo e gás. Um dos vetos de maior destaque foi a rejeição do dispositivo que permitia o ressarcimento amplo a usinas eólicas e solares em situações de curtailment. Este termo técnico se refere aos cortes obrigatórios na produção de energia elétrica, que ocorrem por sobreoferta ou limitações na capacidade de transmissão.
O texto aprovado pelo Congresso previa compensações abrangentes para qualquer evento externo às usinas, inclusive com efeito retroativo. O governo, no entanto, argumentou que tal medida poderia elevar as tarifas de energia em até R$ 6 bilhões, estimulando a sobreoferta e transferindo para o consumidor o custo de energia não aproveitada. A avaliação do Planalto, detalhada no DOU, é que essa alteração ampliaria distorções tarifárias e recompensaria falhas de planejamento do setor, especialmente diante das atuais limitações na rede de transmissão que afetam o envio de energia do Nordeste para outras regiões do país. O ministro Alexandre Silveira já havia classificado o dispositivo como tecnicamente inadequado, defendendo a manutenção de um mecanismo restrito a cortes por limitações de infraestrutura de transmissão.
Outro veto crucial incidiu sobre a proposta que alterava o cálculo do Preço de Referência do Petróleo (PRP), parâmetro para royalties e participações especiais. A emenda derrubada obrigava o uso de cotações internacionais como base principal, além do preço de transferência. Segundo o DOU, essa mudança geraria insegurança jurídica e poderia comprometer projetos de longo prazo no setor de óleo e gás, além de distorcer a arrecadação. Entidades do setor reagiram à proposta do Congresso, com o Instituto Pensar Energia afirmando que a alteração quebraria contratos e reduziria investimentos no pré-sal. O IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás) alertou para a criação de falsa expectativa de aumento de arrecadação e dificuldades em projetos de campos maduros. Em contraponto, a Refina Brasil defendia o dispositivo como uma correção de distorção. Com o veto, a metodologia técnica da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) para o pagamento de royalties e participações governamentais permanece inalterada, assegurando a estabilidade regulatória.
Desdobramentos sobre licenciamento e autoprodução
Além dos vetos ao curtailment e ao PRP, a sanção presidencial também restringiu temas como licenciamento e regras para autoprodução de energia. Embora não detalhados na íntegra das informações fornecidas, esses vetos indicam a intenção do governo de manter um controle mais centralizado sobre processos regulatórios e de evitar flexibilizações que pudessem gerar brechas ou inconsistências no marco legal. A abrangência dos vetos reforça a postura do Planalto em preservar a integridade do planejamento energético nacional e evitar fragmentações regulatórias que poderiam ser exploradas por interesses setoriais específicos.
A decisão de vetar tais pontos demonstra uma preocupação com a coerência da política energética e com a capacidade de o Estado intervir para corrigir falhas de mercado ou excessos regulatórios. A gestão desses aspectos, como o licenciamento ambiental e as condições para a autoprodução, são fundamentais para equilibrar a expansão da capacidade instalada com a sustentabilidade ambiental e a estabilidade da oferta de energia. A manutenção das regras vigentes, portanto, sugere que o governo considerou as propostas do Congresso desfavoráveis a esse equilíbrio.
Próximos Passos
Com a promulgação da Lei 15.269/2025 e a aplicação dos 22 vetos, o setor elétrico e de óleo e gás entra em uma nova fase de adaptação. O mercado deverá agora internalizar as regras que permaneceram e as que foram suprimidas, ajustando seus planos de investimento e estratégias operacionais. A manutenção da metodologia de cálculo do PRP pela ANP traz um cenário de previsibilidade para as empresas exploradoras e produtoras de petróleo e gás, mas pode frustrar as expectativas daqueles que defendiam uma maior alinhamento com as cotações internacionais.
No que tange ao setor elétrico, a rejeição da compensação ampla por curtailment impõe um desafio contínuo aos geradores eólicos e solares, que precisarão lidar com a realidade das limitações da rede de transmissão sem a garantia de ressarcimento total. Este cenário reforça a urgência de investimentos em infraestrutura de transmissão de energia, especialmente no Nordeste, para que a capacidade de geração renovável do país possa ser plenamente aproveitada sem perdas. O governo e as agências reguladoras, como a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), deverão monitorar de perto os efeitos práticos dessas decisões.
Os desdobramentos políticos ainda incluem a possibilidade de o Congresso Nacional analisar e potencialmente derrubar os vetos presidenciais. Embora a decisão do Planalto tenha sido clara e embasada em argumentos de risco tarifário e segurança jurídica, o processo legislativo permite que os parlamentares revisitem os trechos vetados. Essa etapa, contudo, exige quóruns específicos e articulação política, o que adiciona uma camada de incerteza aos cenários futuros da legislação. Até que haja qualquer movimento do Congresso, a Lei 15.269/2025, com seus vetos, dita as novas diretrizes para o setor elétrico e de óleo e gás no Brasil.
Fonte:
Poder360 – Governo sanciona reforma do setor elétrico com mais de 20 vetos. Poder360
