Debates intensos marcam a preparação da conferência climática na Amazônia, confrontando visões sobre o desenvolvimento econômico e a preservação dos ecossistemas marinhos globais, em um embate entre o desenvolvimento sustentável e os interesses do capitalismo fóssil.
A COP30, que terá lugar em Belém, no coração da Amazônia, em 2025, está emergindo como um palco crucial para a redefinição do futuro dos oceanos. Uma complexa “batalha” de ideias e interesses se desenha em torno do conceito de economia azul, gerando profundas controvérsias e questionamentos sobre sua real capacidade de conciliar o desenvolvimento econômico com a urgência da preservação marinha, em um cenário global de crise climática e a persistência do capitalismo fóssil. O evento promete ser um divisor de águas na forma como o mundo aborda os recursos marinhos.
Contexto
O conceito de economia azul tem sido pauta frequente em discussões globais, sendo definido como o uso sustentável dos recursos oceânicos para o crescimento econômico, a melhoria dos meios de subsistência e a saúde dos ecossistemas marinhos. Contudo, como detalhado na reportagem de Sumaúma, a sua interpretação é fluida, variando de uma visão restritiva de proteção até uma que permite a continuidade de práticas extrativistas disfarçadas de sustentabilidade.
Tradicionalmente, as Conferências das Partes (COPs) do clima têm priorizado discussões sobre a descarbonização das economias terrestres e a proteção de florestas, com a Amazônia sendo um símbolo dessa luta. No entanto, a crise climática global tem acentuado a importância inegável dos oceanos, que atuam como gigantes reguladores climáticos, absorvendo grande parte do calor e do dióxido de carbono excedentes na atmosfera.
Essa função vital elevou a pauta marinha a um patamar de urgência inédita para a COP30. A escolha de Belém como sede, uma cidade amazônica, não é meramente simbólica; ela ressalta a interconexão profunda entre biomas terrestres e aquáticos, evidenciando que a saúde do maior bioma tropical do planeta está intrinsecamente ligada à vitalidade de seus rios e, por extensão, dos oceanos.
O debate na COP30 transcenderá a simples conservação, mergulhando na complexidade de como as atividades econômicas ligadas ao mar podem ser reformuladas. O desafio é alinhar essas atividades a um futuro genuinamente sustentável, distanciando-se das lógicas e dos interesses que perpetuam o capitalismo fóssil, que ainda domina grande parte da exploração de recursos marinhos.
Origens e Evolução do Conceito
A ideia de valorizar os recursos marinhos para o desenvolvimento econômico não é nova, mas a ênfase na “sustentabilidade” é um desenvolvimento mais recente. Inicialmente, a economia azul visava promover a inovação e o crescimento em setores como pesca, aquicultura, transporte marítimo e turismo costeiro, garantindo que a base de recursos fosse mantida para as futuras gerações.
No entanto, a pressão de setores industriais tem levado a uma interpretação mais ampla, permitindo que a exploração de combustíveis fósseis offshore e outras atividades de alto impacto ambiental se enquadrem sob o guarda-chuva da economia azul. Esta flexibilidade é a raiz da controvérsia, levantando preocupações sobre o que constitui uma prática verdadeiramente “sustentável” no contexto oceânico.
Impactos da Decisão
As decisões e o direcionamento que a economia azul tomar na COP30 terão ramificações de longo alcance. Uma abordagem rigorosa, focada na transição energética e na proteção, poderá catalisar investimentos em energias renováveis offshore, como a eólica marinha, e impulsionar a aquicultura responsável, o turismo ecológico e a biotecnologia marinha.
Isso poderia gerar milhões de empregos verdes e fortalecer economias costeiras, oferecendo uma alternativa viável e próspera ao modelo econômico baseado em fósseis. Seria um passo significativo para a descarbonização global e a mitigação dos efeitos das mudanças climáticas nos oceanos.
Contrariamente, se a COP30 adotar uma visão branda da economia azul, que acomode interesses extrativistas e de setores intimamente ligados ao capitalismo fóssil, os impactos seriam severos. A continuidade da exploração de petróleo e gás em águas profundas, por exemplo, pode intensificar a poluição, destruir habitats marinhos e aumentar a emissão de gases de efeito estufa.
A reportagem de Sumaúma destaca que esta abordagem flexível poderia funcionar como uma forma de greenwashing, onde atividades prejudiciais são mascaradas com o rótulo de “azul”, comprometendo a biodiversidade e a resiliência dos ecossistemas. As comunidades tradicionais, pescadores artesanais e povos indígenas que dependem diretamente da saúde dos oceanos seriam os mais afetados, enfrentando a degradação de seus meios de subsistência e de sua cultura.
Consequências Socioeconômicas
A apropriação dos recursos marinhos por grandes corporações sob a bandeira da economia azul levanta questões cruciais de justiça social e ambiental. Se não houver marcos regulatórios robustos e mecanismos de governança participativa, a economia azul pode exacerbar desigualdades, marginalizando pequenos produtores e pescadores, enquanto concentra os lucros em poucas mãos.
A COP30 terá o desafio de garantir que a formulação de políticas para os oceanos não seja apenas ecologicamente sólida, mas também socialmente justa, promovendo a inclusão e o respeito aos direitos territoriais e culturais das populações costeiras e ribeirinhas.
Próximos Passos
Até a realização da COP30, em 2025, os meses que antecedem a conferência serão marcados por intensas negociações e articulações diplomáticas. Países, blocos regionais, cientistas, organizações não governamentais e o setor privado estarão empenhados em moldar a agenda da conferência, apresentando propostas e buscando alianças para promover suas visões sobre o futuro dos oceanos e da economia azul.
O Brasil, na posição de país anfitrião, carregará a enorme responsabilidade de liderar esses debates. Sua capacidade de mediar os interesses conflitantes e de defender uma agenda que seja ambiciosa e equitativa será determinante para o sucesso da conferência. O país tem a oportunidade única de demonstrar ao mundo seu compromisso com a proteção ambiental e com um desenvolvimento que não repita os erros do passado.
A mobilização da sociedade civil terá um papel crucial. A pressão de movimentos ambientalistas, de comunidades costeiras e de cientistas será fundamental para contrabalancear os interesses de grupos que buscam flexibilizar as normas ambientais em nome do crescimento econômico. O artigo da Sumaúma sublinha a importância de uma vigilância constante para que as decisões da COP30 não sejam capturadas por interesses predatórios.
A conferência deverá também abordar a necessidade de financiamento robusto para a conservação marinha e para a implementação de projetos de economia azul verdadeiramente sustentáveis, especialmente em países em desenvolvimento. Mecanismos de transferência de tecnologia e capacitação serão igualmente essenciais para garantir que a transição seja global e inclusiva.
Legado da COP30 para os Oceanos
A COP30 tem o potencial de estabelecer um novo paradigma para a governança dos oceanos. Espera-se que a conferência resulte em metas claras, compromissos vinculativos e mecanismos de implementação eficazes que garantam a transição para uma economia azul que seja, de fato, verde, justa e resiliente. O combate à poluição plástica, à pesca predatória e à degradação de habitats costeiros também deverá ser pauta prioritária.
O legado de Belém dependerá da coragem e da visão dos líderes globais em resistir às pressões do capitalismo fóssil e em priorizar a saúde dos ecossistemas marinhos para as futuras gerações. A “batalha” pelo futuro do oceano na COP30 é um chamado à ação coletiva e à responsabilidade global.
Fonte:
Sumaúma – A batalha pelo oceano na COP30: do capitalismo fóssil à controversa economia azul. Sumaúma
