Entre lei e ordem, mérito e governança, a disputa por governos estaduais e o Planalto tende a premiar quem oferecer previsibilidade econômica e institucional — enquanto a narrativa da guerra cultural perde tração fora das redes.
A temporada eleitoral de 2026 promete recolocar o Brasil num teste de maturidade política e econômica. Não se trata apenas de escolher presidente e governadores: o que está em jogo é a capacidade de o país escapar da armadilha do estatismo, resgatar lei e ordem e reduzir a temperatura de uma polarização que, desde 2018, coloniza os humores da praça — dos mercados ao varejo político. Em paralelo, a safra municipal de 2024 já deixou recados a quem quiser escutar: houve avanço significativo de siglas de centro e centro-direita em capitais e grandes cidades, um termômetro que repercute diretamente nas alianças estaduais e federais para 2026. Em São Paulo, por exemplo, a reeleição de Ricardo Nunes contrariou o projeto do PT na principal vitrine do país e reforçou palanques competitivos para a direita e o centro nas disputas que virão, movimento que a imprensa internacional leu como sinal de terreno mais árido para a esquerda nas metrópoles.
A moldura de 2026 inclui, ainda, duas variáveis decisivas. A primeira é a economia política do cotidiano: inflação percebida, emprego, renda e crédito barato (ou caro). A segunda é a governabilidade — no Congresso e nos estados — para aprovar reformas e manter a regra do jogo fiscal minimamente crível. O eleitor médio, menos ideológico e mais sensível ao custo de vida, costuma cobrar entregas palpáveis; a “guerra de slogans” rende pouco se não vier acompanhada de serviços públicos funcionando. É nesse caldeirão que a disputa tende a premiar quem souber acenar com previsibilidade, mérito e segurança — sem ceder ao conforto de narrativas identitárias que, no fim do dia, não baixam preço na feira nem reduzem violência.
O que 2024 já sinalizou para 2026
As eleições municipais de 2024 serviram de laboratório. Analistas notaram que, embora a retórica nacional siga polarizada, o mapa urbano exibiu espaço para arranjos de centro e centro-direita, com desempenho relevante de PSD e MDB e a consolidação de governadores e prefeitos com discurso de gestão. O recado: a sociedade não comprou, em bloco, a escalada de lacração e cultura do cancelamento — e espera soluções de segurança, mobilidade, saúde e educação que escapem da bolha do wokismo. Em São Paulo, a derrota do principal candidato da esquerda encerrou uma temporada de reveses que, somados, reescrevem as expectativas para 2026.
Na avaliação de institutos e observadores estrangeiros, a “onda” conservadora nos centros urbanos não anula a competitividade da esquerda em bases tradicionais, mas devolve ao jogo o eleitor moderado, cansado de radicalismos. Em bom português: o voto pragmático quer lei e ordem, tarifa de ônibus previsível, escolas abertas e fisco que não castigue quem produz. E quer menos ativismo judicial e censura travestida de regulação de redes. Na linguagem do noticiário de direita, trata-se de encerrar a temporada do “governo por espetáculo” e devolver holofotes ao Brasil que dá certo — onde contratos são respeitados, polícia funciona e regras são claras.
As peças do tabuleiro estadual
Se 2026 for, de novo, uma eleição nacional decidida por detalhes locais, os palanques estaduais serão determinantes. Governadores bem avaliados tendem a puxar bancadas e votos para seus alinhados ao Planalto. É a engenharia de quem tem máquina, capilaridade e entrega para mostrar. Nesse contexto, estados com peso demográfico e econômico — São Paulo, Minas, Rio, Bahia, Paraná, Rio Grande do Sul — entrarão como fatores multiplicadores de tempo de TV, militância e arrecadação. O reforço é que, após 2024, a direita e o centro saíram com musculatura logística em várias capitais, e isso “organiza” a disputa de 2026 em torno de temas concretos, especialmente segurança pública e ambiente de negócios.
No plano simbólico, a eleição também será um veredito sobre a fadiga com lulopetismo. A memória dos escândalos do mensalão e do petrolão ainda serve de atalho para o eleitor cansado de corrupção como projeto de poder — um frame recorrente que a direita sabe acionar, sobretudo quando a pauta econômica emperra. A diferença de 2026 é que o adversário do PT, ao que tudo indica, não será uma caricatura da “antipolítica”, mas palanques com gestores que falam mais de obra, crime, emprego e contas públicas do que de guerra cultural. Isso recoloca o PT numa posição defensiva em áreas urbanas onde a sensação de desordem pesa.
Polarização recalibrada: do grito ao dado
O Brasil não deixará de ser polarizado tão cedo. Mas há sinais de recalibração. Relatórios e análises publicados desde 2024 apontaram que o comportamento do eleitor nas municipais foi menos binário do que o Twitter faria crer. Em várias cidades, o voto “descolou” da macro-retórica e premiou quem entregou resultado. O paralelo internacional notou esse movimento: a disputa entre lulismo e bolsonarismo continua definindo humores, mas o voto urbano está mais sensível a lei e ordem e eficiência, e menos disposto a pagar a conta do estatismo de ocasião.
Essa “normalização” não elimina riscos. Há focos de violência política e radicalismo que, se explorados por marqueteiros, voltam à baila. A cobertura internacional capturou episódios grotescos na campanha paulistana de 2024 — de cadeiradas em debates a ameaças entre candidatos — como alerta do que a eleição não pode ser. É um antiexemplo: quando o circo toma a frente, a política vira espetáculo e a narrativa devora os fatos. 2026 terá de mostrar o contrário: confronto de propostas, não de porretes.
Economia do cotidiano: ancorar expectativas sem contabilidade criativa
Do lado das contas, 2026 é divisor d’águas. A convergência da dívida/PIB a uma trajetória sustentável exige mais do que manchete: pede cortes estruturais de gasto, revisão de incentivos distorcivos e um pacto realista com o Congresso. A “solução” de empurrar com a barriga cai mal em mercados que, desde 2022, já conviveram com idas e vindas no desenho do arcabouço e com tentativas de esticar a corda tributária. Se o governo optar por populismo fiscal, a conta aparece no câmbio, nos juros e no crescimento. Se optar por previsibilidade, a curva de juros pode abrir espaço para crédito mais barato, investimento e, portanto, votos. É o básico do Brasil que dá certo: menos retórica, mais execução.
Liberdade, instituições e a tentação do controle
Nenhuma eleição recente no Brasil passou incólume ao debate sobre limites da Justiça e a relação com plataformas digitais. A crítica de direita fala em ativismo judicial, “leis por sentença” e risco de censura disfarçada de regulação. O contrafactual — deixar o ambiente virar faroeste — não é aceitável, mas há um meio-termo que respeita liberdade de expressão e assegura responsabilização a posteriori, sem mordaça prévia. Em 2026, o eleitor que desconfia de “soluções mágicas” tenderá a valorizar quem defender regras estáveis, transparência e menos canetada. É um antídoto contra o populismo autoritário latino-americano, sempre à espreita quando a economia fraqueja e a política resolve “salvar” o país por decreto.
Quem ganha com o quê
Em síntese operacional:
• Quem falar de lei e ordem, apertar o cerco à impunidade e conectar segurança com produtividade tem vantagem nas grandes cidades;
• Quem propor reformas pró-crescimento sem aumentar carga tributária e com corte de gasto improdutivo sinaliza distanciamento do estatismo;
• Quem evitar cair na armadilha da lacração e do marketing de bolha e, ao mesmo tempo, combater a cultura do cancelamento, mostra que entendeu o espírito do tempo;
• Quem resistir ao canto de sereia do controle total — censura, intervenção ad hoc em empresas, ativismo judicial — ganha pontos com o eleitor que paga boleto e quer previsibilidade.
No final, a disputa de 2026 deve ser menos sobre quem grita mais alto e mais sobre quem convence com entregas e números. As tendências captadas por análises e reportagens internacionais desde 2024/25 — a começar pelo desempenho da direita e do centro nas maiores praças e pela proliferação de palanques competitivos fora do eixo lulista — sustentam essa leitura.
O Brasil chega a 2026 com dilemas reais e não imaginários: violência, estagnação de produtividade, educação sofrível e um Estado que cobra muito e devolve pouco. Se a campanha conseguir discutir esses temas sem cair no vale-tudo, há ganho civilizatório. E se, ao cabo, a sociedade optar por candidatos que rejeitem narrativas fáceis, combatam impunidade e resgatem a lógica de mérito, há chance de uma guinada rumo ao Brasil que dá certo — com menos espetáculo e mais serviço entregue.
Fontes:
The Guardian – São Paulo election ‘a horror show’ as candidates trade blows and insults
Financial Times – São Paulo loss caps dismal local elections for Brazil’s Lula
AS/COA – LatAm in Focus: What Do Brazil’s Municipal Elections Say About Polarization in the Region?
Freiheit.org – Brazilian elections 2026: between euphoria & international scrutiny
Kofi Annan Foundation – Electoral Vulnerability Index 2025–2026: Brazil
Wikipedia – 2026 Brazilian general election (regras e calendário)
